Hermengarda,
para chorar a carne pobre e pura
que nenhum de nós viu apodrecer.
Outros viriam lúcidos e enlutados,
e no entanto eu venho embriagado,
Hermengarda, eu venho embriagado.
E se pela manhã encontrarem a cruz
do teu túmulo derrubada no solo
não foi a noite, Hermengarda,
nem foi o vento.
Fui eu.
Quis amparar a minha embriaguez na tua cruz
e rolei pela terra em que repousas
coberta de margaridas e contudo triste.
Eis-me aqui junto da tua sepultura,
Hermengarda,
para chorar o nosso amor de sempre.
Não é a noite, Hermengarda,
nem é o vento.
Sou eu.
(in Fernando Savater, A Vida Eterna, ed. Dom Quixote, 2008)