terça-feira, 18 de outubro de 2011

"T. de telefone", de Pedro Tiago

entende esta verdade,
coberta de musgo e metáforas: a literatura
já não é nada. dizem-me que não posso
escrever isto (isto), porque estou inserido na
contemporaneidade que, de tão aberta, literaria-
mente, me fecha todas as mãos e todos os braços.
e não posso usar metáforas nem lirismo nem posso
repetir os modernistas, porque o modernismo
já passou. e dizem-me que se quero ser lido
tenho de fazer assim, mas nunca entendo muito
bem o que seja isso. vou continuando a ver
velhos a dar milho e pão aos pombos, nos
parques e jardins públicos, ao sol e à chuva,
e isso chega-me. a literatura pode já não ser
nada, mas também, verdade seja dita,
não a pretendo nisto.

(in O Comportamento das Paisagens; ed. Artefacto, 2011)

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