domingo, 4 de dezembro de 2011

"Da desigualdade dos homens", de Czeslaw Milosz

Não é verdade que somos carne
que por instante tagarela, move-se e ambiciona.

Enganadora são as praias apinhadas de corpos despidos
e as multidões nas escadas rolantes do metro.

Felizmente, não sabemos quem vai ao nosso lado.
Pode ser um herói, um santo ou um génio.

Pois a igualdade dos homens é uma ilusão
e as tabelas das estatísticas mentem.

A minha convicção de que a hierarquia se renova a cada dia
provém da necessidade pessoal de adoração.

Piso a terra que guarda as cinzas dos eleitos,
embora não durem mais que as dos outros.

Confesso a minha gratidão e admiração,
à falta de motivo para me envergonhar dos sentimentos nobres.

Oxalá seja eu seja digno de alta companhia
e siga com ela, segurando uma das abas do manto real.

(in Alguns gostam de poesia. Antologia; trad. Elzbieta Milewska e Sérgio das Neves; ed. Cavalo de Ferro, 2004)

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